sábado, 19 de maio de 2012

Mark - Primeira Parte




            Estou eu sentado frente uma televisão assistindo mais um episodio de meu seriado preferido, comendo mais que tudo e ouvindo as gotas de chuva caírem no chão, sentindo um vazio por dentro, uma angustia sem fim. Perdoe-me não me apresentar, sou Mark, 25 anos, solteiro, sozinhos, com medo e triste como sempre.
            Desde pequeno nunca tive uma família como aqueles comerciais de margarina, ou até mesmo como os de novelas. Sou fruto de uma infidelidade de meu pai, um filho indesejado por muitos e mesmo assim tive que viver e sofrer pelo erro de outros. Minha mãe sempre me amou, sempre provou me amar, mas eu não consigo enxergar a sinceridade de seu amor. Eu vejo em seus olhos a tristeza de seus erros, a infelicidade da qual ela vive todos os dias ao lembrar que sua vida poderia ser diferente, que poderia ter tudo que queria, mas devido meu nascimento tudo deu errado. Moro sozinho, uma casa grande, com uma vista linda para o mar em um dia de ondas revoltas como essa noite de chuva.
            Pela manhã já estou suado pela noite cheia de comida e lençóis sobre mim. Na televisão está repetindo novamente os episódios da temporada de minha serie. Olho para o relógio do celular, são 5:30 da manhã. Levanto, tomo meu banho as pressas, estou atrasado. O engarrafamento começa a exatamente 45 minutos é o tempo que eu tenho para poder terminar tudo e sair de casa. O telefone de minha casa toca. Era meu chefe perguntando sobre o projeto que eu tinha que entregar. Meu chefe – Charles Antoni- controlador e centralizador ele se acha o maior arquiteto da cidade, enquanto trai a esposa todas as noites com a prima e melhor amiga dela. Antoni foi meu amigo de universidade, na verdade ele é uma mala e lerdo, só é meu chefe por que seu pai é acionista da empresa na qual nós dois trabalhamos, mas vamos deixar esse carinha para lá.
            Ponto de ônibus. Odeio pegar ônibus, tenho dinheiro para ter um carro, mas odeio a ideia de ter um carro e ter que ficar em um trânsito, sem ninguém ao lado para conversar. Sou revoltado com os cobradores que além de tarados por garotas mais novas ficam ouvindo N tipo de musicas em seus celulares no fone de ouvido e mal cobram a passagem. Sempre quando pego o ônibus me indigno com os idosos em pé, mas fazer o quê? Eu também estou em pé. Parada de ônibus. Chego à portaria da empresa e sempre falo com todas as pessoas do baixo escalão. Ter amizade com as mulheres e homens da limpeza além de ser melhor e mais descontraído você sabe de coisas que nunca achou que saberia.
            Olho uma foto minha de quando criança e me pergunto se eu sabia que tudo aquilo ia acontecer. No meio do caminho me sinto como um nada, como uma fumaça que aconteceu, me sinto levado pela vida e não um condutor dela. Sinto-me perdido e não sei como encontrar o caminho. Eu tenho medo de não ser lembrado por alguém, tenho medo de ser um ninguém. Todas as vezes que durmo acho que ninguém me ama e que todos ao meu redor só disfarçam quem são. Acho que todos são mascaras, farsas. Não consigo confiar nas pessoas, acho que elas metem constantemente, acho que são atores eternos. São consumidores de suas próprias vidas de forma tão banal que eu me apavoro em pensar o que será de mim. Tenho medo de ser esquecido, mesmo sabendo que isso vai acontecer, tenho medo de não ser amado, mesmo sabendo que isso nunca pode ter acontecido.
            O medo que me apavora às vezes toma meu corpo, minha alma. Ligo constantemente para meu melhor amigo, nenhuma das minhas ligações ele atende, acho que também nossa amizade é uma mascara uma farsa. Até que me reanimo e digo que mesmo sendo tudo isso que eu acho, mesmo sendo falso, cruéis precisamos criar na vida a esperança da mudança, de lutar pelo que você quer, de nunca deixar a vida levar o que é seu, mas você guardar, você juntar, você fazer-se ser lembrado. No meio dessa insegurança me encho de tudo do que sou e do que não sou. Me faço gente e me desfaço por que na verdade de todas essas palavras que aqui escrevo, nenhuma ainda exprime o que eu realmente sinto e não sei se realmente é o que sinto.
            Por nunca ter tido a família que imaginava todas as noites deitados nos sofás das camas das pessoas de que meu pai conhecia, pela incapacidade dele de levar-me para sua casa, de enfrentar seu medo, enfrentar as discussões por alguém que ele dizia que amava, que ele dizia que era importante, mas que todos os dias do ano não ligava, não mandava um oi, eu nem sabia se ele estava vivo. Imagina a família em que meus filhos sentiriam orgulho do pai que terão, da família em que eles vivem, dos amores de sua vida. A família em que eu serei lembrado pela pessoa que sou e não pela que tenho que me fazer ser.
            Sentado aqui lembrei-me de uma noite como essa, chuvosa, estava eu passando as “férias” com meu pai. Novamente como todos os anos ele nunca tinha coragem de levar-me para sua casa, a não ser fugido, como um ladrão leva o fruto de seu roubo para casa. Estava eu em casa de uma amiga dele deitado no sofá improvisado como cama, ouvindo as gotas caírem no chão e o vidro embaçar. Eu pensava comigo até quando eu seria o erro? Até quando seria o fugitivo de um nada? Até quando eu seria o Judas da crucificação de Cristo? A verdade é que sempre me senti parte de um nada, um nada em que não sei o que é ou o que deixou de ser. Sinto-me tão só que não consigo falar para mim mesmo sobre meus erros e acertos, por que me sinto condenado pela minha razão.
            Quando criança eu pensava que o meu objetivo de vida deveria ser trazer o riso a face das pessoas. A minha tristeza jamais deveria ser compartilhada, minhas lagrimas deveriam ser guardadas para entre as noites solitárias, para com os meus vazios, as pessoas tem problemas de mais para os meus, as pessoas tem coisas de mais para as minhas. Meu único problema e tão pequeno era nunca ter tido uma família de verdade, igual aquele comercial de margarina ou até mesmo as famílias de novelas, inventadas, feitas por outras pessoas que nem são família, mas só aquele ar falso já contentava minha triste e solidão.
            A cada segundo que eu penso sobre essas coisas eu remeto-me ao meu passado e procuro esquecê-lo, mas parece que ele volta com mais força, parece que ele vem para me engolir. Espera mensagem de texto. Era minha namorada. Está chamando-me para tomar um Milk shake esta noite. Pensei aqui por um minuto em não ir, mas fazer o que sozinho, sai para lá tristeza, vamos quero namorar.
            Poxa já é de noite e eu ainda estou aqui na minha sala. Mensagem de texto. Novamente minha namorada, já está no estacionamento- diferente de mim ela tem carro. Tenho que ir depois eu falo mais sobre essas coisas de minha vida. Sabe do que mais, apesar disso tudo eu aprendi com a vida que não se deve desistir nunca de seus sonhos, de seus medos e de seus desejos. Que foda-se o resto vá em frente lute e faço o que você poxa. A vida é sua e não de sua vizinha fofoqueira. 

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